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Good vibes não resolve

Rodrigo Lyra, aluno de doutorado do IRI, conta, entre outras coisas, que em momentos como esse, é preciso saber se posicionar porque "ignorar é ser conivente. É preciso marcar posição."



Na semana passada, discuti em um grupo de WhatsApp. Um grupo com amigos, em que nunca nada além de cerveja e futebol havia sido debatido. Ainda. Eu mesmo nunca havia discutido política em um grupo, nem na época das eleições. Ainda. Eu mantinha um certo orgulho de não ter caído em provocações ou gasto energia nesse tipo de discussão em 2018, de não ter rachado grupos de familiares ou de amigos. Ainda. Mas descobri, também nestes últimos dias, que o “ainda” é irritante. Quando os comentários e as opiniões se tornam tão ofensivas, descoladas da realidade e contra a vida,  ignorar é ser conivente. É preciso marcar posição.

Resultado: discuti e ficou climão. Não me trouxe energia positiva e talvez não tenha mudado a opinião de ninguém, vai saber. Percebi, porém, que me posicionar foi preferível do que, uma vez mais, ignorar absurdos em nome da tal “good vibes”. Isso me lembrou Milan Kundera, em “A insustentável leveza do ser”, livro que reli no mês passado, por indicação de um colega aqui do IRI. Nele, há personagens que passam pela vida sem se envolver emocionalmente, sem criar raízes ou inimizades, e personagens que levam a vida de maneira mais pesada, agindo da maneira oposta. Ao contrário do que sempre pensei, levar a vida de maneira mais leve não foi solução nesse romance, porque a leveza também traz seu peso. Foi bom refletir sobre isso neste momento atual, em especial porque o “caminho do meio” é relativo a cada pessoa e talvez nem mesmo exista.

Passei por diferentes fases nessa quarentena. Houve aquela em que predominou angústia e o impulso, quase inevitável, de assistir a todos os noticiários. Uma vontade parecida com aquela de comer um bolo de brigadeiro, mesmo sabendo que sou intolerante à lactose e que ele me fará mal. A diferença para o bolo é que não há um prazer inicial em assistir aos noticiários. A semelhança é que ambos causam dor de estômago. Essa fase passou, contudo, e começou uma nova, repleta de energia positiva, em que fazer yoga, meditação e exercícios ocupava grande parte do meu dia. É uma fase ótima, se não fosse a ilusão de que conseguiria permanecer nela indefinidamente. Cheguei, então, à conclusão de que enfiar good vibes goela abaixo de si mesmo e de outros esconde, também, uma incapacidade de lidar com momentos ruins na vida. Passou essa fase e começou a atual, de busca por uma altíssima produtividade acadêmica, irreal e igualmente deletéria. Como fingir que meu pai não está na linha de frente e me concentrar em um artigo sobre integração regional? Essa leveza alienada é pesada demais para mim e eu dispenso.

Sou da opinião de que quanto mais alguém diz estar em equilíbrio e precisa mostrar isso, mais longe essa pessoa de fato está dele. Eu por exemplo, estou bem longe. Nestes dias, venho observando que discutir e marcar minha posição em grupo de WhatsApp ou com pessoas próximas me faz bem, no final das contas. Nos dias mais difíceis, lembro de uma música de Yann Tiersen, compositor francês que fez a trilha sonora do filme “Amélie Poulain”, chamada “Les jours tristes”, que diz:

It's hard

But you know it's worth the fight

Cause you know you've got the truth on your side

When the accusations fly

Hold tight

Don't be afraid of what they'll say

Who cares what cowards think? Anyway

They will understand some day

Some day

When all objectivity's gone

And it's gone

But you still

Carry on

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